Conto: Sem títulos - Sem roteiros

  • segunda-feira, agosto 04, 2014
  • Postado por Um Novo Sol PJ
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Foram tempos difíceis os de realidade. Todos os dias eu me via perdido enquanto dava sinal para o ônibus parar ou até mesmo ao almoçar na esquina do trabalho. Eu não sabia pra onde ir. Não sabia também o que fazer. Era estranho, porque cada dia simplesmente passava. Eu, às vezes, me perguntava se tinha algum objetivo na vida e a resposta dessa pergunta ficava em branco. Minha vida era uma avaliação do ensino médio e eu a entregava só com o meu nome assinado.

Talvez as pessoas pensem que é preciso estudar e ter um bom emprego pra viver feliz. Talvez elas pensem que o mais importante é amar a Deus sobre todas as coisas. Talvez amar alguém incondicionalmente seja a melhor forma de viver ou talvez você simplesmente viva um dia após o outro tentando encontrar essa resposta. A questão aqui, caro colega, é que eu acho que percebi o que a gente realmente precisa na vida.

Há alguns dias atrás um amigo pegou uma caneta, pediu meu braço e escreveu uma palavra nele: MAKTUB. Até ali eu fiquei com muitas dúvidas. Eu queria saber o que significava, mas ele não me contou. O mais incrível é que a bateria do meu celular havia acabado e nós estávamos em um acampamento com outros colegas do serviço. Ao voltar pra cidade e pra correria do dia-a-dia, esqueci-me de procurar o que aquilo significava, esqueci também de tentar ficar encontrando uma resposta pra tudo o que acontece comigo. Foi um fim de semana de tranquilidade, digamos. Um fim de semana que me fez voltar pra casa e querer dar bom dia pra cada pessoa que passasse com o rosto ‘mal-encarado’ na rua. Não sei se vocês sabem, mas fazer um retiro, de vez em quando, faz um bem enorme para nós. A loucura do dia-a-dia pode ser quebrada, os problemas podem ser esquecidos e nós podemos nos dedicar à calmaria e ao silêncio interior. Nossa mente relaxa e nosso corpo também.

O lado ruim é que a volta à cidade e às responsabilidades do dia-a-dia nos estressam novamente. Você levanta com o pé direito e fica de mau-humor. Você não, eu. Acho que não posso ficar falando dos outros, quando o assunto aqui sou eu. Parece que não tenho paciência. E realmente não tenho, sabe. Ou então não aprendi a ter. Acontece que, desde a minha infância eu, de alguma forma, aprendi a ser uma pessoa sozinha, mesmo sem querer isso.

Outro dia fui ao supermercado e caí. É, caí. Me espatifei no chão. Sorte que o estabelecimento estava quase-que-vazio. O mais estranho foi que encontrei uma pessoa ali, cruzando o corredor onde eu estava. E essa pessoa me viu no chão, prestes a levantar; e prestes a começar a falar sozinho e reclamar pra Deus que ele é um inútil que me fez cair com alguns produtos diretamente no chão. Mas ao passo que minha raiva aumentava, ao olhar pra essa pessoa... bem, eu não sei explicar o que aconteceu direito. É óbvio que fiquei com vergonha, mas isso me fez esquecer da raiva e de xingar Deus e todos os seus anjinhos loirinhos de cabelos cacheados. A anestesia que me sondava sumiu de repente.

A rotina que me entorpecia, o calor do sol que não ardia e o cheiro das pessoas que passavam despercebidos simplesmente passaram a habitar em mim. É estranho falar isso, mas é realmente o que eu senti quando olhei para aqueles olhos castanho-escuros e para aquele rosto preocupado em saber se eu estava bem. A anestesia passou e a cirurgia foi feita: meu peito queimava, minhas orelhas também. Seus olhos me tocavam e me tiravam pra dançar. Suas mãos, ao me ajudar a levantar, fizeram algo percorrer por todo o meu corpo e isso não era só o meu sangue, sabe!?

 Vocês devem estar pensando que, depois de levantar, eu peguei o telefone dessa pessoa, nós passamos conversar todos os dias, vimos um filme, tivemos dois filhos, fomos ao parque, discutimos Caetano, planejamos bobagens, e morremos de rir, né?! Mas não. Não foi o que aconteceu. A única coisa que sobrou desse momento foi que eu descobri o que significava MAKTUB. Tá bom, eu não descobri; eu apenas me lembrei, pois já tinha pesquisado no famoso Google e ele me apontou diversos sites e imagens que falavam sobre isso. Eu já tinha visto, mas tinha esquecido.

No fim das contas, cada um foi pra sua casa e voltou à rotina do dia-a-dia. Foi isso o que aconteceu e é isso que acontece na maioria dos dias com milhares de pessoas por aí. O lado bom é que eu passei a entender que a gente precisa parar de tentar encontrar um sentido pra tudo, precisa parar de procurar por algo em cada rua que passamos e de acreditar que o destino vai nos trazer alguém que vai mudar completamente a nossa vida. É óbvio que o que digo aqui não é uma lei universal, mas também é óbvio que não acontece com todo mundo e que também não vai acontecer.

“Durante muito tempo, deitava-me cedo. Às vezes, mal apagada a vela, meus olhos se fechavam tão depressa que eu nem tinha tempo de pensar: "Vou dormir". E, meia hora depois, a ideia de que já era tempo de conciliar o sono me despertava: queria deixar o livro que julgava ainda ter nas mãos e assoprar a vela”, queria só e somente descansar.

E assim foi.

Autora: Rafaela Campos.

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